sábado, 29 de novembro de 2008

Lacuna

Há tempos que não posto.

Olha que não faltaram assuntos. Mas fim de ano é sempre meio corrido, e não dá tempo de escrever muito.

Por enquanto, vou falar um pouco das declarações do talvez mais importante escritor vivo da língua portuguesa, o Saramago, que está no Brasil divulgando seu mais novo livro.

Fiquei surpreso com o fato de ele ter voltado atrás na questão da Reforma Ortográfica. Era uma das vozes que se posicionavam contra a reforma, mas mudou de opinião. Disse agora que é importante para fortalecer politicamente o idioma. Será? Apesar de não gostar de contrariá-lo, acho que ele se engana.

Mas, de qualquer modo, fiquemos com um trecho de "O Ano da Morte de Ricardo Reis".

"Fernando Pessoa levantou-se do sofá, passeou um pouco pela saleta, no quarto parou diante do espelho, depois voltou, É uma impressão estranha, esta de me olhar num espelho e não me ver nele, Não se vê, Não, não me vejo, sei que estou a olhar-me, mas não me vejo, No entanto, tem sombra, É só o que tenho. Tornou a sentar-se, cruzou a perna (...) levantou-se, Vou-me chegando, Já, Bem, não julgue que tenho horas marcadas, sou livre, é verdade que a minha avó está lá, mas deixou de me maçar, Fique um pouco mais, Está a fazer-se tarde, você precisa descansar, Quando volta, Quer que eu volte, Gostaria muito, podíamos conversar, restaurar a nossa amizade, não se esqueça de que, passados dezasseis anos, sou novo na terra, Mas olhe que só vamos poder estar juntos oito meses, depois acabou-se, não terei mais tempo, Vistos do primeiro dia, oito meses são uma vida, Quando puder, aparecerei, Não quer marcar um dia, hora, local, Tudo menos isso, Então até breve, Fernando, gostei de o ver, E eu a si, Ricardo, Não sei se posso desejar-lhe um feliz ano novo, Deseje, deseje, não me fará mal nenhum, tudo são palavras, como sabe, Feliz ano novo, Fernando, Feliz ano novo, Ricardo."

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Sempre é bom lembrar

Neste ano de 2008 estamos comemorando os 60 anos da proclamação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, pela ONU. Vejamos alguns trechos:

Artigo 19
Todo o homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a
liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir
informações e idéias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras.

Artigo 26
I) Todo o homem tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos
nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória.

II) A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da
personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do homem
e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a
tolerância e amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos.

Também neste ano estamos comemorando os 20 anos da promulgação da nossa Constituição Federal, que, entre outras coisas, diz o seguinte:

Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
VII - garantia de padrão de qualidade.

VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.

Quem disse que as leis não prestam?

sábado, 15 de novembro de 2008

Pontos Corridos

Vamos para a tradicional conversa de boteco: o Campeonato Brasileiro. Desde o início do formato dos pontos corridos, nunca o campeonato esteve tão interessante, com tantos times com possibilidades de ganhar o título (apesar de o São Paulo estar mais próximo). O que só reforça a tese de que campeonato como o Brasileiro só pode ser por pontos corridos. Um sistema mais justo e, invariavelmente, mais emocionante.

A partir de 2003, os campeonatos da Série A e B passaram a ter esse formato, e também se acabaram as constantes "viradas de mesa" que faziam com que os clubes grandes deixassem de disputar a Segunda Divisão. Assim, após 5 anos, começa-se a observar um fenômeno muito presente nos países europeus: a disputa do título aos poucos vai se restringir a alguns poucos times fortes e raras exceções. Por exemplo, na Itália, o título é sempre disputado por Juventus, Inter e Milan. Essa concentração fez com que equipes historicamente fortes hoje estejam em segundo plano (como Genoa, Sampdoria e Torino).

Ainda é muito cedo para falar, mas, em seis anos de competição neste formato, o São Paulo esteve entre as cinco primeiras colocações em cinco oportunidades (2003, 2004, 2006, 2007 e 2008), o Santos em quatro (2003, 2004, 2006 e 2007), o Cruzeiro em três (2003, 2007 e 2008) e o Palmeiras em três (2004, 2005 e 2008). São, portanto, os times de melhor retrospecto nesses últimos seis anos. Por outro lado, Vasco, Botafogo e Atlético Mineiro ainda não disputaram as primeiras colocações. Poderia o sistema de pontos corridos limitar também no Brasil ao longo dos tempos o número de times considerados grandes? Se sim, é melhor que os clubes se preparam adequadamente para mudar esta lógica.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Sobre ciência e Igreja

O assunto era "Galileu e o Papa". Mas falou-se um pouco dos gregos: do modelo geocêntrico ptolomaico e do modelo heliocêntrico de Aristarco. Afinal, as idéias gregas sobre astronomia influenciaram todos os pensadores e cientistas a partir de então.





Ambos os modelos passaram para a história, mas durante mais de um milênio somente um foi aceito: o modelo geocêntrico de Ptolomeu. Primeiro talvez por questão de bom senso: oras, a Terra deve ser o centro do Universo. Mas havia outros motivos.

Um deles é meramente científico: não se conseguiu observar na época a chamada "paralaxe estelar", que seria a diferença de ângulo na observação de uma estrela ao longo do tempo. Realmente, se considerarmos a posição de uma estrela vista da Terra em um dado instante, verificamos que certo tempo depois ela não é a mesma, em relação a um ponto fixo (ponto fixo que pode ser, por exemplo, outra estrela bem mais distante). Isto não poderia acontecer se fosse a Terra o centro do Sistema Solar, com o Sol girando em torno dela. Somente a órbita da Terra ao redor do Sol explica essa variação. Mas na época o fenômeno não pôde ser observado, até por falta de tecnologia. Daí, descartou-se o modelo de Aristarco.



Havia também o motivo religioso. Há passagens no Antigo Testamento que nos permitem afirmar que o Sol gira em torno da Terra. Somente na semana passada eu li um dos trechos a respeito - graças à pesquisa da minha aluna. Está em Josué, 10:

"Então Josué falou ao Senhor (...): sol, detém-se sobre Gibeom, e tu, lua, sobre o vale de Aijalom. E o sol se deteve, e a lua parou, até que o povo se vingou de seus inimigos. (...) O sol, pois, se deteve no meio do céu, e não se apressou a pôr-se, quase um dia inteiro."

Daí que ocorreu todo o problema com Galileu, já no século XVII, quando ressurgiu o modelo heliocêntrico. Galileu foi lá falar para os chefes da Igreja que eles não estavam interpretando de acordo a Bíblia. E daí vem a Inquisição, a negação dele e o lendário "eppur si muove".

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

"Yes, we can!!"

Nem a desgastante prévia entre os candidatos do partido Democrata nos EUA atrapalhou a derrota dos republicanos, algo que já se esperava desde o início do ano. É lógico que a crise imobiliária ajudou no voto anti-Bush, mas já havia um descontentamento e uma necessidade de mudança nos rumos da política e da sociedade norte-americana.

Além disso, alterações demográficas no território estadunidense foram fundamentais para um avanço dos democratas nos estados centrais. Aumentou o número de latinos e de jovens em alguns históricos redutos republicanos, o que poderia explicar uma alteração no resultado das eleições.

No entanto, apesar de ser perfeitamente imaginável uma derrota do candidato de Bush, não se imaginaria, há pouco tempo atrás, a vitória de um negro numa eleição para presidente dos EUA. Uma vitória simbólica: depois dela, não há dúvidas que a história dos Estados Unidos no século XXI tomará um rumo novo.

E outra coisa. Vendo o triunfo de Obama, não dá para não se lembrar do que Martin Luther King disse há 45 anos.



domingo, 2 de novembro de 2008

Maradona treinador

Sempre causa estranheza ver uma pessoa desempenhar uma função para a qual não tem a mínima experiência prévia. Logo, a designação de Dunga para técnico da Seleção Brasileira não agradou a maioria dos fãs. O mesmo aconteceu nesta semana com a chegada de Maradona para comandar a Seleção Argentina.

Algumas profissões requerem experiência prévia e anos de estudo. Afinal, quando alguém precisa de uma intervenção cirúrgica, confia mais em um médico que tenha estudado vários anos, que tenha muita experiência e seja especialista naquilo que faz. O mesmo ocorre na educação. Um professor sem estudo não presta para nada. E assim por diante.

Mas, convenhamos, em relação ao futebol não se pode dizer o mesmo. No futebol, a emoção fala mais alto que a razão, e a presença de um dos maiores jogadores da história (mesmo nunca tendo sido um exemplo de atleta) no banco da Seleção Argentina será emocionante para os amantes do futebol. Ainda mais depois de tudo que ele passou nos últimos anos.